O internetês foi absorvido pela língua portuguesa


A Academia Brasileira de Letras atualizou o seu Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa com termos que estão em uso, mas não eram até aqui considerados oficiais, como é o caso de deletar.

A expressão deletar um arquivo de computador não é mais jargão de quem lida com informática. O termo passa a ser aceito como uma palavra da língua portuguesa escrita no Brasil. Ele faz parte de um conjunto de cerca de 6 mil novas palavras incluídas na recente edição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, lançada pela Academia Brasileira de Letras (ABL). 

Além de reconhecidas, as novas palavras passam a ter uma grafia oficial definida. Agora é possível deletar um arquivo, assistir a uma teleconferência e até tomar suco de acerola – frutinha hoje comum no mercado, mas rara nos dicionários. Também foram incluídos termos como Internet, scanear e mouse, entre outros da informática. Eles se somam às 400 mil palavras catalogadas na primeira edição do vocabulário, de 1982. 

Diferentemente de um dicionário, que se preocupa em explicar o significado de uma palavra, um vocabulário apenas lista as palavras. Seu objetivo é consolidar a grafia delas (o modo como são escritas), classificá-las segundo o gênero (masculino ou feminino) e categoria morfológica (substantivo, adjetivo etc.). É também um instrumento normatizador oficial, por ter sido feito pela Academia.

Critérios

Para entrar no vocabulário, a palavra tem de ser usada por um autor ou em alguma situação que tenha importância, ou seja, ter uso corrente na TV ou em jornais, diz o lexicógrafo Antônio José Chediak, coordenador da equipe que elaborou o vocabulário. Ou seja, uma língua não pode ser pensada de maneira isolada em relação à sociedade, sua cultura e os processos que a atravessam. Esses processos influenciam e modificam aspectos de uma língua de formas diferentes.

E, devido à influência crescente da tecnologia e da ciência, os termos usados nesses campos tendem a ganhar mais importância nos modos de expressão das sociedades atuais. "Desde o século 19, a linguagem tecnológica tem tomado conta do vocabulário culto. Eu diria que a tecnologia tem sido a grande responsável pelo aumento do vocabulário culto", diz o linguista Antônio Houaiss.

A influência da tecnologia sobre a nossa vida pode ser percebida no vocabulário. "Quase dois terços das novas palavras vêm da tecnologia e da informática", diz Arnaldo Niskier, presidente da Academia Brasileira de Letras. Para um termo ser aceito como uma palavra, não basta que ele seja usado por um grupo de pessoas. "Se a TV e os jornais usam um termo, ele acaba se popularizando. Uma língua é dinâmica e tem de refletir as mudanças de uma sociedade", diz Diógenes de Almeida Campos, da Academia Brasileira de Ciências. Ele integrou a equipe que elaborou o vocabulário.

E printar?

Além da difusão, é preciso que um termo substitua outro em determinada área. É o caso de deletar, explica Chediak. O mesmo não ocorre com outro termo usado em informática, printar. "Em português existe a palavra imprimir. Julgamos que o uso de 'printar' não é amplo o suficiente para incorporá-lo como palavra nova", diz Niskier. A diferença entre os dois casos, continua Niskier, se apóia em um limite: a manutenção da identidade de uma língua. "A linguagem tende a se globalizar e, nesse processo, o inglês tende a ganhar espaço, mas é necessário preservar as raízes de cada povo. É preciso estar aberto a esses processos, mas evitando exageros."