ECA: INTERPRETAÇÃO (Conselho Tutelar)


*Poder de polícia

Órgão permanente. O Conselho Tutelar ser um órgão permanente não significa que deva funcionar 24 horas por dia, o que é exigível apenas dos serviços de atendimento. O Conselho Tutelar é permanente no sentido de que ‘veio para ficar’, não estando à sorte ou vontade do Prefeito, desta ou daquela autoridade.

Órgão autônomo. A autonomia do Conselho Tutelar se expressa de duas formas: 

1. em como o Conselho Tutelar vai atender suas atribuições, que tipo de ações irá realizar, de que forma se relacionará com a família, a comunidade, a sociedade e o Poder Público para a defesa dos direitos das crianças e adolescentes, etc. 

2. em que medidas irá aplicar e quando é o momento para aplicá-las. Em ambas não pode existir qualquer interferência.

Órgão NÃO jurisdicional. O Conselho Tutelar não pertence ao Poder Judiciário, não é um apêndice seu, nem veio simplesmente para desafogar a sobrecarga de trabalho dos ex-juízes de menores – embora assumam as situações jurídico-sociais a eles antes destinadas. O Conselho Tutelar é um órgão administrativo, ligado ao Poder Executivo Municipal, sendo desta natureza seus atos e suas ações. Então, o Conselho Tutelar não possui o poder de ‘dizer o direito num caso concreto’ (isso é típico e exclusivo à jurisdição).

Encarregado pela sociedade. Há uma necessidade de estreita ligação do Conselho Tutelar com a comunidade. Os conselheiros tutelares devem ser “feitos do mesmo barro da sociedade”. Ao conselheiro não basta a legalidade da escolha, é preciso a legitimidade pelo desempenho da função. A forma de escolha mais democrática é através do voto direto, universal e facultativo dos munícipes, em processo divulgado na grande mídia.

Zelar pelo cumprimento dos direitos. Zelar é administrar, é fiscalizar, é estar atento. Zelar pelo cumprimento de direitos não é atender os direitos, e sim fiscalizar para que quem deva atender não se omita. O Conselho Tutelar é um órgão de correção exógena, atuando supletivamente não para satisfazer a necessidade de atendimento, mas para promover a defesa de direitos e requisitar serviços indispensáveis. Anteriormente à aprovação do ECA, a redação que conceituava o Conselho Tutelar dizia: “... tendo por finalidade o atendimento dos direitos da criança e do adolescente”, e isso tinha estreita ligação com os requisitos à candidatura de conselheiro, que previam a necessidade de formação superior nas áreas de pedagogia, serviço social, psicologia, direito ou sociologia. O texto do Estatuto aprovado não contempla essa velha redação; a finalidade não é o atendimento dos direitos, mas zelar pelo cumprimento dos direitos, defender e garantir para que aquele que deve atendê-los o faça, por isso nem se exige escolaridade, porque a sua nova função, são necessários outros saberes, habilidades e competências.

No mínimo um Conselho Tutelar. O Conselho Tutelar é uma das maiores conquistas sociais na busca da proteção e efetivação de direitos, sendo um organismo público e social de máxima importância. Todo município deve possuir um Conselho Tutelar para o exercício das atribuições previstas na Lei. O Ministério Público é o agente competente para ajuizar a ação de responsabilidade do município pela não criação e falta de estruturação do seu Conselho Tutelar. O número de Conselhos Tutelares no município deve representar o necessário para cumprir somente o seu papel de fiscal do Sistema de Garantia e Proteção Integral, e não o número necessário para atender tudo aquilo que a família e os serviços públicos e comunitários ainda não estão fazendo. A necessidade de ter que funcionar 24 horas por dia, pode ser resultado do alto índice de ameaça ou violação de direitos praticado no município.

Cinco Membros. As ações e as decisões devem ser do Conselho, fruto do coletivo e não do individual, pelo que se chamam de ações e decisões colegiadas. A população quando escolhe, escolhe um conselho e não um conselheiro, embora seja possível o voto singular. A ideia é do trabalho de grupo, da conjunção de ações, do interrelacionamento das habilidades e potencialidades dos membros, da construção conjunta. As atribuições previstas no ECA são do Conselho Tutelar e não do conselheiro tutelar, por isso é inadmissível que um Conselho Tutelar funcione com menos de cinco conselheiros (não estou falando de todos estarem o tempo todo juntos, nem de eventual atraso, falta, folga, licença, e dispensas legais).

Requisitos à candidatura. A primeira discussão que se trava é acerca da possibilidade ou não da ampliação de requisitos. Existe divergência na doutrina e na jurisprudência, mas a corrente amplamente majoritária prevê a possibilidade das leis municipais acrescentarem outros requisitos. Assim, os requisitos do ECA seriam apenas gerais, mínimos para todos os municípios brasileiros, independente de tamanho. Cabe a cada município, verificando sua particular necessidade, estabelecer através de lei, outros requisitos específicos. Dos que conhecemos com maior previsão, podemos citar a experiência no trato com crianças e adolescentes por período mínimo de 2 anos, o atestado de saúde física e mental, a indicação ou abono de entidades e órgãos públicos ligados à área infanto-juvenil, o grau de escolaridade, a prova de conhecimentos do ECA, e a entrevista com os candidatos.

Encaminhamento dos casos judiciais. Os casos de competência do Juiz da Infância e da Juventude são aqueles previstos nos arts. 148 e 149 do ECA. Assim, sempre que tratar-se de algum desses assuntos, o Conselho Tutelar encaminhará o caso à autoridade judiciária. Como visto no inciso III supra, ainda existem os requerimentos judiciais facultados pelo art. 194 e ss. do ECA, além daqueles provenientes da fiscalização de entidades (art. 191 e ss.). Providenciar a medida estabelecida pelo juiz ao adolescente infrator. A medida a ser providenciada pelo Conselho Tutelar já deve vir estabelecida pelo juiz, dentre as do art. 101, I a VI do ECA. Afora a medida estabelecida pelo juiz, poderá o Conselho Tutelar cumular qualquer outra medida, desde que não afronte a medida judicial. No atendimento realizado ao adolescente, o Conselho não deve enfocar o ato infracional praticado, deve verificar e analisar a situação de risco pessoal e social dele. Há controvérsia quanto a impossibilidade do juiz aplicar a medida de abrigo (art. 101, VII, do ECA), sendo mais encorpada a que impede a aplicação. Aos que admitem, vigora o fundamento de que “quem pode mais – internar -, pode menos – abrigar -. Aos que não admitem, respondem pela letra da lei, além da natureza e do conteúdo da medida de proteção.

Competência. Estamos falando dos limites territoriais de exercício das atribuições, não do poder de agir. Na matéria, o art. 138 remete-nos ao art. 147 do ECA, estabelecedor da competência do Juiz da Infância e da Juventude. Nos termos do inciso I do art. 147: “a competência será determinada pelo domicílio dos pais ou responsável”, mas à falta dos pais ou responsável, “a competência será determinada pelo lugar onde se encontre a criança ou adolescente” (inciso II). É preciso dizer que a falta dos pais, no inciso II, não é aquela momentânea, de ocasião, mas aquela consagrada como tal, a ausência. Afora a pacífica aplicação dos incisos I e II, existe divergência doutrinária a respeito da aplicação ou não dos parágrafos, notadamente do primeiro, que diz respeito à determinação da competência em razão do local da prática do ato infracional. Neste sentido, Luís Edmundo Labanca e Paulo Lúcio Nogueira, como também nós entendemos, posicionam-se pela aplicação única dos incisos. Seja em que hipótese for, será apresentado ao Conselho Tutelar com competência de ação na área do domicílio da família e da comunidade. A única hipótese de alteração de competência é no caso da falta dos pais, quando, por inexistência ou ausência deles, o Conselho Tutelar competente é o do local onde a criança ou adolescente se encontra.