'O fiz'


COM INFORMAÇÕES DE CIPRO NETO

Uma mulher, certa vez, disse: Eu não vou sê-lo.

Mas, por ser do gênero feminino, a mulher não deveria ter dito Eu eu não vou sê-la?

Não mesmo. Entenda: O que pode ser visto aí é o pronome demonstrativo neutro (o), transformado em lo, porque se agrega encliticamente à forma verbal ser, terminada em r (suprime-se o r do verbo e transforma-se o pronome o em lo).

O demonstrativo o pode equivaler a isto, isso ou aquilo, e é justamente por isso que é neutro, o que significa que não varia. 

Quando se diz algo como O que ela fez é perfeitamente compreensível, emprega-se o o com valor de isso (Isso que ela fez é perfeitamente compreensível). 

Numa frase como Ela diz que sou irrecuperável, mas sei que não sou isso, pode-se substituir isso por (Ela diz que sou irrecuperável, mas sei que não o sou).

Convém lembrar que o pronome demonstrativo o pode substituir toda uma oração, o que se vê nestes memoráveis versos de "Ainda Uma Vez - Adeus", de Gonçalves Dias: Erro foi, mas não foi crime, / Não te esqueci, eu to juro: / Sacrifiquei meu futuro, / vida e glória por te amar.

Em Não te esqueci, eu to juro, o demonstrativo o (que aqui aparece fundido com o pronome oblíquo te) substitui a oração Não te esqueci. Em outras palavras, os versos de Gonçalves Dias equivalem a Não te esqueci, eu te juro isso (ou Não te esqueci, eu te juro que não te esqueci).

Numa passagem anterior do mesmo poema, encontramos este verso: Que me enganei, ora o vejo. Mais uma vez, o pronome demonstrativo o substitui toda uma oração (que me enganei).

No poema de Gonçalves Dias, pode ser visto uma passagem: Nadam-te os olhos em pranto, / Arfa-te o peito.... Em suas duas ocorrências, o pronome te equivale a teus e teu, respectivamente (Nadam os teus olhos em pranto, / Arfa o teu peito...), Na ordem direta, teríamos Os teus olhos nadam em pranto, / O teu peito arfa...).