Fragmento 9


Não saberia dizer, com exatidão, como ele havia se tornado um amigo tão dócil. Acabávamos sempre nas mesmas rodas de conversas em madrugadas perdidas. Mas uma coisa é certa: já era adulto, ou um recém-adulto, beirava lá pelos 22 anos, apesar do jeito simplório e inocente de tratar as coisas da vida; de qualquer forma, isso não o deixava menos charmoso. Pelo contrário: sua patetice ingênua combinava, de certo modo, com o jeito atencioso como ele tratava qualquer um de nós. Sempre fora educado além da conta e era benquisto por todos, exceto por alguns de nós que não toleravam seus gracejos espontâneos. Agora, depois dos 24 anos, continuava o mesmo rapaz que eu ainda recusava chamar de homem pela imaturidade tardia conferida a alguns jovens - sobretudo do sexo masculino. O curioso, e nada estranho, é que ele possuía predicados que atraíam outros rapazes, e poucas mulheres. Era, sim, muito atraente e sua natureza comportava essa beleza. Branco, de poucos pelos escuros no rosto, cabelos curtos e finos, havia caminhos, em seu corpo, formados por uma pelagem escassa que definia suas axilas. O contorno escuro na pele branca alcançava uma harmonia quase que artística. Enquanto seu peitoral era liso e grande, como um elegante mármore alvo, suas pernas ostentavam curvaturas bem definidas, cobertas por uma camada enegrecida e grossa de filamentos capilares bem alinhados. Seus braços mantinham a forma firme dos músculos assim como suas costas, que atraía a imaginação pela arqueadura delineada e diversas pintas discretas, que cobriam a pele. Uma combinação que nos fazia fitá-lo dos pés, bem tratados e claros, alojados em chinelos confortáveis, a seus olhos, inundados de uma sinceridade fronteiriça. Ele não era um amigo qualquer, daqueles de pouco entrosamento e acenos voluntários. Mas se revelava ser alguém para liberdades. Havia certa cumplicidade na risada e nas intenções, entretanto, ele ainda era um doce enigma que cheirava a algodão limpo. O fato é que até então, depois de anos, ainda devoto minutos da minha insônia tentando desvendar tamanho mistério de brandura e afetuosidade.

Alecto Grego